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"Olympia" de Vera Mantero

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Única descrição desta peça no programa da sala original: Vera Mantero, improvisações, 5 minutos.

Acho que ninguém da organização fazia muito ideia do que eu ia fazer. E acho que não demorou só cinco minutos. O programa era o da Maratona para a Dança, uma iniciativa já histórica criada em 1993 por uma série de bailarinos e coreógrafos que tinham decidido fazer o País acordar. Para a dança que nele se fazia. Quando me contactaram para participar eu respondi entusiasticamente que sim e pus-me a pensar o que poderia fazer para “acordar” as pessoas. Andava por essa altura a ler a “Asfixiante Cultura” do Jean Dubuffet e pareceu-me absolutamente indicado ler passagens do livro naquela ocasião a quem quer que fosse que estivesse presente no Teatro Maria Matos. “Mas ler como? E não será um pouco pretensioso, ir práli dizer que eu é que sei o que é a verdadeira cultura, a melhor cultura? Se calhar devia estar nua...Tenho que ler o Dubuffet nua. Especada de pé em frente a um microfone? Não, isso não pode ser...Então a fazer o quê? Nua...?”. Esta nudez fez-me então pensar na Olímpia, do Manet, que tinha visto recentemente no Musée d’Orsay, em Paris, onde ainda estava a viver na altura. “E se fosse a Olímpia a ler o Dubuffet? Ai!, não!, que horror, aí é que me caiem todos em cima, sacrilégio à pintura, etc. etc...”. Contei ao André Lepecki que queria ler o Dubuffet nua mas que não sabia como o fazer sem ser só ler o Dubuffet nua, sem lhe falar sequer do quadro. Então não é que ele me diz: “Oh Vera, não te lembras da Olympia do Manet [que tínhamos visto juntos]? Acho que devias fazer qualquer coisa com ela”.[!!!].

E assim fiz.

Vera Mantero

A Olympia de Vera Mantero

Vera Mantero numa nudez total ressalvada apenas por uns chanatos de quarto azul-bebé atravessa numa diagonal o palco do teatro, lentamente, arrastando uma cama de ferro presa ao seu braço esquerdo, como se se tratasse de um pesado fardo. Na mão direita segura um exemplar do livro Asfixiante Cultura de Jean Dubuffet.
Mais uma vez, Vera Mantero vai às outras artes e disciplinas (aqui a pintura e sociologia) roubar, esventrar, citar o que necessita para a sua dança, para que a dança seja – toda ela – menos insuficiente.
No final do seu percurso a coreógrafa bailarina senta-se sobre a cama desfeita e olha fixamente para o público. Esta Olympia de Vera Mantero está para além da dança, para ser uma performance sobre o uso do corpo. De repente e apenas por breves minutos todos os monstros, todos os rebeldes de Goya a Artaud são convocados para testemunharem a história do uso do corpo pela cultura do poder, mas também o da rebeldia dos corpos. Em cinco minutos se expõe, claramente, a relação mercantil da arte com o dinheiro, mas também a sua denúncia.

António Pinto Ribeiro, in Dança Temporariamente Contemporânea

concepção e interpretação
Vera Mantero

desenho original de luz
João Paulo Xavier

adaptação e operação de luz
Bruno Gaspar

texto
Jean Dubuffet

música
extractos de música dos Pigmeus Bakma, Camarões

duração
15 minutos

agradecimentos
a Ana Mantero e Miguel Ângelo Rocha

Cast: o rumo do fumo

Tags: Olympia, Vera Mantero, O Rumo do Fumo, Dance, Dança and Perfromance


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